A Carta Magna e os direitos da criança e do adolescente.
Siro Darlan, desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e estagiário da Escola Superior de Guerra.

O Estatuto da Criança e do Adolescente completou 21 anos de publicação no último dia 13 de julho e a forma escolhida para comemorar essa data tão importante não tem sido prestigiada pelas autoridades responsáveis pela sua efetivação.
Ainda são muitas as crianças que excluídas das prioridades legais na elaboração de políticas públicas vivem nas ruas e logradouros públicos sem qualquer assistência. Famílias igualmente abandonadas abandonam seus filhos a sua própria sorte e esses vão procurar sobreviver com seus próprios meios como instintivamente fazem todos os animais.
Enquanto a previsão legal é de existência de Conselhos Tutelares, um para cada 400 mil habitantes, e bem aparelhados para cumprirem sua tarefa de bem cuidar das crianças garantindo o respeito aos seus direitos, a Cidade do Rio de Janeiro, que se prepara com milionários recursos públicos para sediar os dois mais importantes eventos esportivos do Planeta, tem uma defasagem de 40 Conselhos Tutelares, pois apenas dez estão instalados precariamente.
Enquanto a lei prevê a oferta de programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatra e toxicômanos, a Prefeitura reponde com um serviço de recolhimento de usuários de drogas em espaço sem qualquer proposta terapêutica, com superlotação e péssimo atendimento, que mais se equipara a um campo de concentração do que um espaço de tratamento.
O mais estranho é que esse fato é do conhecimento do Ministério Público que tem esse fato abusivo documentado e filmado, e, paradoxalmente apóia essa ação criminosa da Prefeitura. O que tipifica esse fato como crime é o artigo 230 do ECA que diz que é crime “Privar a criança ou o adolescente de sua liberdade, procedendo à sua apreensão sem estar em flagrante de ato infracional ou inexistindo ordem escrita da autoridade judiciária competente.”
Nos países civilizados esse fato e a exploração sexual infantil são equiparados a crimes hediondos punidos com rigor. Aqui, graças a um processo de insensibilidade coletiva, permite-se que se cometam barbaridades com crianças e adolescentes ainda na melhor doutrina da situação irregular, já espancada de nosso ordenamento jurídico desde 1990.
A demonialização das drogas por parte da opinião pública tem contribuído para a manutenção desses excessos na aplicação das leis que devem proteger os cidadãos, sobretudo os mais vulneráveis que são as crianças, os adolescentes, os idosos e os portadores de necessidades especiais.
As crianças necessitam de cuidados especiais pela sua condição peculiar de pessoas em desenvolvimento. Se usam drogas é preciso alimentá-las com informações, e cuidados especiais, assim como buscar as origens dessas opções. Muitas vezes a droga serve para aliviar a fome, o frio e a solidão. Portanto já conhecemos o antídoto. Aprisioná-las e isolar do convívio social certamente não é a melhor terapia.