A primeira Prefeitura do Brasil.
Siro Darlan. Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e membro da Associação Juízes para a Democracia.
Quando a Corte portuguesa chegou para aqui instalar o novo Reino, criou uma instituição encarregada da supervisão do teatro, e da vida pública da corte em geral. Foi criada por D. João VI a Intendência Geral de Polícia. Era a instituição encarregada de garantir a limpeza, e abastecimento de água e comida, segurança e saúde da cidade, além de promover o “bem comum” e cuidar do “bem público”. O escolhido para a função foi um magistrado formado em Coimbra de nome Paulo Fernandes Viana. Recebeu logo como missão acomodar os recém-chegados funcionários da corte, ministros do gabinete real e seus familiares.
Inaugurou o que hoje faz a Prefeitura desapossando os moradores para promover a especulação imobiliária, sob pretexto de realizar uma Olimpíada que não durará 30 dias. Viana usava o mesmo discurso, “sendo hoje uma Corte”, o Rio de Janeiro precisava de “propriedades de outra ordem, que a enobrecesse e aformoseasse.” Viana foi também o precursor das internações compulsórias removendo das áreas em torno do palácio no centro da cidade as tabernas e barracas de peixe indecorosas e ajuntamentos barulhentos.
Como Intendente Geral de Polícia tinha a responsabilidade de policiar as ruas, expedir passaportes, vigiar estrangeiros, fiscalizar as condições sanitárias dos depósitos de escravos, construção de aquedutos, pontes, fontes, passeios e praças públicas.
Impôs a lei antivadiagem, antecessora da atual lei de drogas, mandando prender desertores, “homens suspeitosos”, “mulheres escandalosas”, e proibiu a “excessiva prostituição”. Muitas mulheres foram então acusadas de terem levado maridos, pais e filhos à perdição e foram expulsas do Rio de Janeiro. Naqueles tempos candidatos a prefeito não batiam ainda, só expulsavam as mulheres indesejadas. Tudo isso Viana era autorizado a fazer para manter “a ordem e a tranquilidade públicas”.
Viana tinha ainda um papel de mediador dos conflitos sociais e baixava editos disciplinando as relações entre proprietários e escravos. E, ainda ouvia e encaminhava soluções para inúmeros conflitos familiares, comerciais e de cidadania. Supervisionava e admitia ou não recursos para as audiências reais, que acontecia quando o próprio Soberano ouvia os súditos e até os escravos, ditando soluções para pequenos conflitos.
O atual prefeito aperfeiçoou ainda mais os métodos de dominação pois, detém a administração das escolas públicas impondo aos estudantes o sistema de aprovação automática, disfarçado de Conceito Global. Nos conselhos de classe realizados bimestralmente, os professores combinam se vão reprovar ou não, sem avaliar se os estudantes lêem ou não. A SME estipula índices de aprovação, as Coordenadorias regionais ” orientam ” as diretoras a perseguirem quaisquer professores que não aumentem, ainda que mentirosamente, as notas dos estudantes. Com o diário On Line as diretoras alteram mais, facilmente, as notas baixas, como os professores não querem saber, a fraude continua. Não confiando nessa única estratégia, elaboraram provas objetivas de marcar X, facílimas, para que os estudantes obtenham maiores notas, ainda que, mais uma vez, fraudulentas. A maioria dos professores aceita essas imposições em troca de benefícios, como: abono de faltas irregulares, não previstas na CLT, nem no estatuto do servidor; recompensas em dinheiro por uma falso aproveitamento, menos trabalho, horas extras … Os pais, a seu turno, submetem-se em troca de doação de bolsas de estudo e vale alguma coisa, e sobretudo, não terem que assistir aos seus próprios filhos porque dá trabalho educar e a reprovação significa também, em muitos casos, desleixo, de alguma maneira também dos responsáveis. Grande parte dos responsáveis não conseguem ensinar aos estudantes mas há outra parcela desleixada. Uma grande parte dos estudantes desinteressam-se porque os professores não lecionam nada ou quase nada. Alunas que foram minhas no passado relatam que os professores sentam-se ligam os computadores e dão o mínimo de matéria possível, limitando-se a pegar as provas da prefeitura e trabalhar as questões, quando não fornecem o gabarito, na íntegra, na hora das provas.
Uerj em greve, escolas estaduais inoperantes, escolas municipais sem recursos, salas superlotadas, greve à vista… Só as ditaduras sobrevivem com suas histórias de início, meio e fim; numa sociedade que se quer democrática, há que se pensar também sobre o acaso.” A gente toda não quer só comida, quer comida, diversão, arte, oportunidades, casa, rua, endereço, lealdade, justiça e paz.”