A dignidade da mulher.

Siro Darlan, desembargador do Tribunal de Justiça e Membro da Associação Juízes para a Democracia.

                                   Duas importantes decisões dos Tribunais Superiores apontam na direção da valorização da autonomia da mulher sobre o seu corpo e sua importância, quando mãe, no desenvolvimento sadio de crianças e adolescentes. Na primeira, em brilhante voto do Ministro Barroso proferido na Primeira Turma do STF, em discussão a respeito da criminalização do aborto no primeiro trimestre, afirmou que a criminalização é incompatível com os direitos fundamentais sexuais e reprodutivos da mulher, que não pode ser obrigada pelo Estado a manter uma gestação indesejada; afirma ainda que a criminalização atenta contra a integridade física e psíquica da gestante, que é a pessoa que sofre, no seu corpo e no seu psiquismo, os efeitos da gravidez; e, ainda o princípio da igualdade de gêneros, já que os homens, por não engravidarem não sofrem tais restrições, e para haver equiparação plena é preciso respeitar a vontade da mulher nessa matéria.

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                                   A outra decisão, de igual importância foi a aplicação pela 5ª Turma do STJ do direito da mulher condenada com filhos de cumprir pena em regime de prisão domiciliar para cuidar das filhas menores. Apesar do crime ter sido considerado hediondo e a pena ter sido de seis anos de reclusão, o Colegiado avaliou que a preponderância do princípio da proporcionalidade deveria estar o bem-estar das crianças que têm o direito à convivência familiar e o direito de ser criado e cuidado pela sua família. É preciso destacar que o direito preponderante é o da criança que pelo texto constitucional tem assegurado, com absoluta prioridade, o direito de ser criado no seio de uma família.

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                                  Havendo previsão, como de fato há na Lei 13.257/16, que estabelece princípios e diretrizes de políticas públicas para a primeira infância, a pena de prisão pode ser substituída quando a condenada mãe tiver filhos menores de doze anos, que dependam dos cuidados maternos, ou, ainda se sendo pai, seja a única referência familiar para o exercício da paternidade e os cuidados necessários para a criança.

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                                   Sempre haverá vozes contrárias a essas duas medidas judiciais que aplicam a lei com a sensibilidade social que os casos requerem. A lei deve ser aplicada visando atender aos fins sociais a que se destina. Mas esse é o bom senso que deve prevalecer nas decisões judiciais fundamentadas. Visa respeitar os princípios da dignidade da pessoa humana que diante de fatos, que testemunhamos diariamente de misoginia legal impedem a efetivação da igualdade de gêneros desejada e assegurada na Carta Maior, assim como o crescente número de filhos e filhas abandonados pelos familiares, voluntária ou arbitrariamente, que causam danos irreparáveis à infância e aumenta a violência que atinge toda sociedade.

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