Oh mundo tão desigual.
Siro Darlan, desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e Membro da Associação Juízes para a Democracia.

Participei da inauguração do novo anexo do Tribunal de Justiça com muita tristeza e decepção. De um lado esse carnaval. Um luxo que repugna qualquer pessoa diante dos contrastes em que vivemos como membros de um judiciário que está nas vitrines, levando pedradas de todos os lados. Um judiciário que ainda é incapaz de gerar um boletim de produção de seus juízes que reflita a realidade do volume de trabalho de cada magistrado, sacrificado no seu dia a dia.
Enquanto nos deliciamos com a obra de um “visionário” e da DELTA, os advogados e as partes reclamam aflitas da morosidade dos procedimentos. No Juizado de Bangu, onde já estive e fotografei a juíza despacha numa “caixa de sapatos”, onde se as testemunhas entrarem os advogados tem que ceder suas cadeiras, não se fornecem cópias das atas aos advogados por economia, os banheiros são precários e há todo tipo de carências para se prestar minimamente um serviço de qualidade. Há processos que leva até um ano para ir à conclusão dos juízes. Em Nova Iguaçu, o povo aguarda o atendimento ao relento, na chuva.
Aí está mais uma obra pública muito mais luxuosa e imponente do que qualquer obra das corporações privadas. Mais um Palácio fora de época, já que não somos uma monarquia e a época dos palácios já está longe e fora de moda. Do alto desse novo palácio sequer há janelas para se olhar para fora e vir o que se passa lá embaixo.
Há os que se alegram com isso, são pessoas insensíveis e incapazes de se exasperar com tamanhos contrastes que nos deixam envergonhados. Tá na hora de ouvir o Gil cantando “Oh! Mundo tão desigual. Tudo é tão desigual. De um lado esse carnaval. De outro a fome total”.