CONSTRUINDO UMA DOUTRINA DE PROTEÇÃO INTEGRAL.

Passados 30 anos de posse como magistrado no já distante 21 de julho de 1982, resolvi contar algumas passagens interessantes e marcantes dessa vida dedicada à magistratura. A realização desse sonho é produto de vários fatores, mas principalmente da Providência Divina. Como pode um menino pobre vindo do sertão da Paraíba alcançar tão alta e nobre honraria. O fato de vivermos verdadeiramente numa sociedade democrática, onde todos podem ter oportunidades de ascensão social se se esforçar e estudar muito é um dos fatores.
Mas o grande empurrão deve-se a um encontro casual nos corredores do Fórum, quando por aí perambulava como rábula de vários escritórios de advocacia, com o meu querido Mestre de direito civil o desembargador que presidiu esse Tribunal Humberto Manes, que ver-me determinou que eu me inscrevesse no concurso que estava aberto para magistratura do Rio de Janeiro. Pouco acreditando no êxito atendi a esse conselho do Mestre querido.
Outro fator que muito me ajudou foi o acolhimento do grupo de colegas que estudavam na acolhedora casa da desembargadora Elizabeth Filizzola, que incluía o colega Francisco Asevedo, Teresa Savini e outros igualmente queridos. O fato de ter sido registrado com o nome de Siro com s também me ajudou, pois assim pude assistir a quase todas as provas orais e aprender as manhas dos examinadores.
Tudo isso aconteceu em meio às responsabilidades de prover uma família e ter que trabalhar nos escritórios de advocacia do DR. Paulo Santos, do Dr. Orlando Paes e dar assessoria uma imobiliária. Jogava nas onze e ainda cursava o CEPAD com mestres brilhantes e cultos.
Finalmente veio o resultado e fui aprovado, designado para a minha primeira Comarca, que agente nunca esquece, assumi em Silva Jardim. Era uma felicidade só. Quisera nunca ter saído daquele paraíso onde era juiz de tudo, cível, criminal, infância e juventude. fazenda pública, eleitoral e até trabalhista.
Já aí despertou minha grande paixão pela causa das crianças. Fundei com a ajuda de senhoras da sociedade local uma sociedade de apoio e ajuda aos menores, ainda sob a égide do Código de Menores, a SOBAM, Sociedade de Apoio aos Menores. No interior o Juiz é uma autoridade importante e respeitada e eu sempre morei no local onde trabalhava como manda a lei. Logo nos primeiros meses fui visitado pelo Prefeito da cidade, Geraldo Moreira que desejava me apresentar seu cunhado, Presidente da Câmara dos Vereadores que já deseja me homenagear como título de cidadão silvajardinense.
Aceitei honrado a homenagem, que teria de ser submetida ao plenário pelos nove vereadores. Contudo, logo ficou explícito o motivo da homenagem. O Presidente da Câmara e cunhado do Prefeito tinha uma causa possessória onde buscava impedir que um vizinho de origem germânica tivesse garantido o direito de passagem para escoar sua produção.
Após fazer uma inspeção pessoal ao local que incluiu o uso de um trator, passando para um cavalo e finalmente um burro, chegamos ao alto da colina, fonte do litígio. Após firmar meu juízo de valor prolatei a sentença deferindo o uso da servidão de passagem para o chamado “nazista fugitivo”.
Na semana seguinte foi apreciada pela Câmara a proposta de outorga do título de Cidadão Silvajardinense, que foi negado por nove a zero, nem o proponente votou a favor. Esse honraria eu só viria a receber vinte anos mais tarde, quando já era desembargador.
Aqui também recebi minha primeira representação das muitas que se sucederiam. Mas a primeira representação agente nunca esquece. Havia recebido uma determinação do então Tribunal de Alçada para reintegrar na posse uma poderosa proprietária de terras chamada Aca Costa, cuja propriedade havia sido invadida há muitos anos por posseiros e familiares. Ao receber a ordem e determinar o “Cumpra-se Venerando Acórdão”, e para evitar um possível conflito, determinei uma audiência especial com os posseiros para que desocupassem as terras pacificamente, uma vez que a Comarca contava apenas com um Oficial de Justiça “ad hoc”.
Essa cautela foi suficiente para que os poderosos advogados representassem junto à Segunda Instância dizendo que eu havia me negado a fazer cumprir a ordem superior. Claro que após minhas informações a representação foi arquivada, até porque por essa fórmula de cautela os posseiros desocuparam a área invadida pacificamente.