O operário crucificado.
Siro Darlan, desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e Membro da Associação Juízes para a democracia.

No Monte Calvário, após ser barbaramente torturado e condenado á morte por um juiz omisso e covarde, que lavou as mãos fugindo a sua responsabilidade de decidir, Jesus foi crucificado. Antes Ele já ensinara que “Tudo que fizestes a um destes pequeninos a mim o fizestes”. Ora diariamente Cristos são crucificados por nossos atos de violência ou desamor. Popularmente se diz que cada um carrega sua cruz para se afirmar que é duro ganhar o pão de cada dia com o suor de nosso corpo.
Com grande sensibilidade o artista Carlos Latuff retratou em seu quadro denominado “Por uma cultura de paz” um operário, que assim como tantos outros semelhantes tem sofrido diversas formas de violências. A maior e mais constante tem sua origem num Estado que mantém acesa a cultura da violência, seja pela falta de políticas públicas inclusivas, seja por uma política de segurança de exclusão dos cidadãos menos respeitados nos seus direitos fundamentais.
A polícia retratada no quadro nada mais é que o braço armado do Estado, mas não significa que os policiais, operários da segurança pública, não sejam também vítimas dessa violência institucionalizada. O agravante é que sendo agentes do Estado têm o dever de cumprir ordens, transferindo essa responsabilidade pela violência para seus superiores hierárquicos.
Contudo, repetindo a história alguns magistrados, lavando as mãos, se apressaram na repressão a uma obra de arte afrontando a Lei Maior que assegura em seu artigo 5º que “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”. O terrorismo de Estado muda os personagens e travestem-se com modalidades as mais diversas, mas os cidadãos devem estar sempre atentos que são as mesmas ideias totalitárias que identificam suas intenções reducionistas dos direitos fundamentais.