SINDICÂNCIA PARA APURAR A GUARDA DO QUADRO “POR UMA CULTURA DE PAZ”.

No dia 12 de setembro fui notificado pelo Corregedor Geral da Justiça, desembargador Valmir de Oliveira Silva, de que o Órgão Especial na sessão do dia 9 de setembro havia decidido autorizar a retirada do quadro do artista Carlos Latuff da parede de meu gabinete e que instaurara uma sindicância para apurar “conduta considerada afrontosa à decisão colegiada”.
A “conduta afrontosa” consistiu em dar “asilo artístico” ao quadro perseguido. O quadro retrata um operário negro sendo alvejado por um policial, tal como ocorrera em 2011 quando a juíza Patrícia Acioli foi morta por 21 tiros saídos das armas de policiais militares que deveriam protegê-la ou como ocorreu com o operário Amarildo na Rocinha, que após ser retirado de seu lar, do convívio com sua família foi devidamente “desaparecido” pela ação policial.
A verdade costuma condoer os algozes e seu cúmplices e o que retratou o artista Carlos Latuff despertou a ira dos atingidos. Quando o Crucifixo foi retirado do Órgão Especial por deliberação unilateral de um desembargador que sequer ouviu seus pares, não se instaurou qualquer sindicância. Afinal, disseram todos cordeirosamente, o Estado é laico e não pode ostentar símbolos religiosos. Talvez a intenção fosse retirar o Cristo crucificado, símbolo histórico do mais ignóbil e injusto julgamento da humanidade para que não testemunhasse as “tenebrosas transações” cantadas por Chico Buarque.
Não houve sindicância e prevaleceu a vontade de um único magistrado no Silente Colegiado. Seguiram-se, já sem o testemunho do Crucifixo, concursos fraudados, com favorecimentos de amigas e parentes, superfaturamento de obras, fraudes na distribuição de documentos com alteração de datas, omissão de socorro na segurança de uma magistrada morta por policiais, formação de ‘listas prévias’ para promoções futuras por merecimento. E, nenhuma sindicância pedida ou instaurada.
Concursos foram realizados, inúmeros cargos continuaram vagos nas serventias e os concursados esforçados – que dedicaram preciosos tempos de suas vidas com dispêndio de recursos grandes – não foram convocados, mas suas vagas foram ocupadas por “estagiários” explorados com baixíssimos salários (menos de R$ 600 reais), sem supervisão e com perda de qualidade de serviço. E, nenhuma sindicância…
Liminares foram avocadas e cassadas sob argumento de prejuízo para o interesse público, ilegitimidade do Estado para ser réu, pois prédio que precisava ser desocupado estava prestes a desabar seria da União Federal. Mas, depois, graças às pressões populares, o próprio governante interessado voltou atrás comprovando não haver qualquer prejuízo para o verdadeiro interesse público, que o prédio era estadual e que não ameaçava cair. Assim foi com o caso do Antigo Museu do índio, bem como com o Parque Aquático Júlio Delamare e com o Estádio de Atletismo Célio de Barros. E, nenhuma sindicância foi aberta.
Magistrados são suspeitos de favorecimento em leilões de imóveis de Massas Falidas, comprados a preço de banana, promovidos por Varas Empresariais, e, por aqui, não há noticias de sindicâncias, embora haja no CNJ.
Já estava saudoso destes processos disciplinares, após responder a 52 representações quando juiz da Primeira Instância. Esta, a primeira no segundo grau me enche de orgulho, sobretudo por sua motivação mesquinha. Quem sabe não ostento mais uma “medalha” no meu peito? Pelo menos será por uma boa causa, já que estarei na defesa de um direito constitucional de manifestação cultural livre de censura.
O poder legítimo não se ofende com a crítica. Ao contrário, a reconhece como legítima num contexto de pluralismo. O poder legítimo se pauta pelo Direito e não pela vontade do mandante. Mas, o poder, quando mal investido, torna-se arbítrio e teme qualquer tipo de contestação. A diversidade é tida como ofensa pessoal. As oligarquias sempre buscaram reforçar seu poder ilegítimo pelo temor e pela violência. A simples discordância representa um “perigo” para os pseudo-poderosos. O poder legítimo não precisa destes meios para se afirmar. Naturalmente, ele é acolhido e acatado. O verdadeiro poder, que se exerce em nome e para a coletividade, é humilde e não se serve dele para sua própria vaidade.