NEGLIGÊNCIA INSTITUCIONAL.
Siro Darlan, desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e Membro da Associação Juízes para a Democracia.

A morte violenta e covarde da criança Bernardo no Rio Grande do Sul mostra como são tratados os direitos das crianças e dos adolescentes pelos tribunais brasileiros. Embora seja dado status de prioridade absoluta pelo texto constitucional a causa das crianças, assim como em outras áreas da administração pública vem sendo tratada com absoluta negligência. Os juízes da infância costumam ser escolhidos sem qualquer critério razoável, predominando sempre o político do apadrinhamento e do descaso. Raramente aparece na titularidade um juiz vocacionado e comprometido com a causa da infância.
Mesmo quando o juiz demonstra os cuidados necessários no exercício de seu múnus protetivo e sócio educativo são os tribunais que não respeitam o teto legal que os obriga a dotar os juizados de infraestrutura compatível com a importância desse serviço judicial tão especial. Raramente consta da proposta orçamentária dos tribunais recursos para a manutenção de equipe interprofissional, que deve ser concursada e capacitada para assessorar a Justiça da Infância e da Juventude.
Por outro lado não estão os magistrados habituados a trabalharem em conformidade com o sistema de garantias de direitos das crianças e dos adolescentes atuando sempre como autoridades distantes de seus parceiros sociais. A falta de atuação conjunta com os Conselheiros Tutelares, e não como se fossem seus subordinados, contribui para que as autoridades municipais releguem os conselhos tutelares, importante ferramenta de proteção á infância em estado de miserabilidade e igualmente sem qualquer recurso para uma atuação mais eficaz.
A insensibilidade social dos administradores dos tribunais do Brasil faz com que atuem como verdadeiros Pilatos cada vez que acontece uma tragédia como a que acometeu a criança gaúcha. Lavam as mãos como se não fossem corresponsáveis por essa negligência que extermina milhares de crianças pobres e negras no país. Não é de hoje que os administradores públicos nas três esferas do poder a deixarem de investir na efetivação do respeito aos direitos fundamentais dos pequenos brasileiros provocam mortes e prisões prematuras, por lançarem com suas negligências essas crianças e adolescentes na exclusão social e na marginalidade.
É claro que se estivessem funcionando as ferramentas criadas pela lei para uma boa e necessária prevenção não estaríamos discutindo temas como a redução da responsabilidade penal que só aumenta a irresponsabilidade dos administradores públicos e o fosso que separa os brasileiros com dos sem direitos.