RIO – Após 15 dias da desocupação do terreno da Oi, no Engenho Novo, na Zona Norte, o arcebispo do Rio, cardeal dom Orani Tempesta, se reuniu, neste sábado, com cerca de 40 pessoas, entre representantes da prefeitura, do poder executivo, legislativo e judiciário, como os deputados federais Chico Alencar, Alessandro Molon, e o desembargador Siro Darlan. O objetivo do encontro foi discutir a ocupação da Catedral Metropolitana do Rio pelos invasores, que lá permanecem desde a semana passada. Mesmo após três horas de reunião, o impasse continua. De acordo com dom Orani, não há previsão para a solução do problema:
— Não é algo que se resolva de uma hora para outra. Isso não será um consenso fácil. Por isso criamos essa comissão. Mas esperamos que dentro de uma semana resolvamos pelo menos uma parte da situação.
A resolução parcial a que o cardeal se refere é a possibilidade de envio, a partir deste sábado, de parte das famílias para um abrigo da prefeitura em Jacarepaguá, na Zona Oeste, com capacidade para cerca de 80 pessoas. Segundo levantamento do Banco da Providência, há 74 famílias ocupando a catedral, num total de 195 pessoas. O grupo invadiu o terreno da companhia telefônica no dia 31 de março. No dia 11 deste mês, cinco mil pessoas foram retiradas do local pela Polícia Militar, após uma ação de reintegração de posse determinada pela Justiça.
A coletiva de imprensa que se seguiu após a reunião aconteceu em clima de discordância, principalmente entre o desembargador Siro Darlan e o representante da prefeitura, o secretário Davi Carlos Pereira, sobretudo em relação à possibilidade de inclusão dos ocupantes no cadastro de aluguel social.
— O aluguel social não é, a princípio, uma solução — disse Pereira. — Mas estamos, desde o início, tentando fazer um mapeamento completo das famílias para estudar a possibilidade, mas há resistência ao mapeamento por parte das pessoas. Precisamos saber a renda de cada família, quantos familiares existe em cada núcleo, aonde residiam inicialmente, se já foram contemplados com algum programa do governo…
O desembargador Siro Darlan rebateu:
— Enquanto isso, a resposta do governo é nada. Apesar de termos ficado aqui durante três horas, nada foi resolvido. E o povo continua na rua sem abrigo. Cerca de 50% das pessoas são menores de idade. O resto são grávidas e idosos. O governo está demonstrando uma profunda insensibilidade com a questão.
O líder da ONG “Respeito é bom e eu gosto”, Paulo Silveira, completou:
— A sensação é de que o estado pretende vencer pelo cansaço. Existem hoje no Rio 700 mil famílias cadastradas aguardando moradia.
O secretário da prefeitura disse desconhecer o número.
— Não há omissão do estado aqui. Mas a solução não pode ser “ou aluguel social ou a gente não sai” — disse Pereira. — E não são apenas 74 famílias. São cerca de duas mil no total, contando com as que não estão na catedral. Primeiro, precisamos fazer esse mapeamento social. E há o abrigo em Jacarepaguá, com capacidade para cerca de 80 pessoas. Obviamente não é nenhum hotel 5 estrelas, mas tem as adequações necessárias.
De acordo com Darlan, os dados referentes aos desabrigados já existe e foi feito por assistentes sociais do Banco da Previdência. Segundo o documento que o desembargador apresentou, das 74 famílias, apenas seis possuem emprego formal. Das 195 pessoas, 73% é menor de 30 anos, 50% menor de 18 anos e 40% menor de 14. Além disso, 23 famílias estão inscritas no programa do governo federal Minha Casa Minha Vida; e 20 no Bolsa Família. A maioria dos desabrigados é de analfabetos.
— O abrigo é mais uma balela da prefeitura! — disparou Darlan. — Lá permanecerão por menos de 24 horas, porque as condições que a prefeitura dá são precaríssimas. Eles pedem habitação e um aluguel social, mas mais uma vez a prefeitura responde negativamente. Deveriam haver verbas para estas situações de emergência. E há. O que não há é vontade política para decidir isso.
Questionada a respeito do cancelamento dos eventos da Semana Santa, a Arquidiocese do Rio disse que em nenhum momento a catedral foi fechada, e que apenas a porta central está trancada. De acordo com a instituição, o cancelamento dos festejos ocorreu por temerem conflitos violentos no interior da catedral.
Famílias ocupam a catedral desde a semana passada
Famílias de invasores do terreno da Oi, que ficou conhecido como Favela da Telerj, ocuparam a área da Catedral Metropolitana do Rio na semana passada, levando a Arquidiocese a cancelar os eventos da Semana Santa — o tradicional Auto da Paixão de Cristo e a Missa de Páscoa.
Em reação à reintegração de posse do terreno invadido no Engenho Novo, os invasores uma manifestação que terminou em violência. Quinze ônibus foram atingidos, sendo que quatro foram totalmente queimados, e outros três veículos foram incendiados parcialmente, incluindo uma Blazer da PM. Dois supermercados foram saqueados e três agências bancárias acabaram depredadas.
No confronto com a PM, 18 pessoas ficaram feridas, entre elas três crianças e nove policiais militares. Na ocasião, 27 pessoas foram detidas. Destas, 21 suspeitos de participar dos saques aos supermercados.