O cristão é reconhecido pela partilha.
Siro Darlan, desembargador do Tribunal de Justiça e membro da Associação Juízes para a democracia.
Após 15 dias ao relento os desalojados da Prefeitura/Oi Telerj, foram finalmente abrigados num espaço digno, antes destinado aos peregrinos da Jornada Mundial da Juventude. Durante esses dias quase duzentos cariocas, quase todos analfabetos, mais de 50% crianças, adolescentes e idosos, muitos doentes e todos sem teto permaneceram no estacionamento da Catedral tomando chuva e sol.
Embora abandonados pelos governos municipal e estadual, foram o tempo todo acolhidos pela caridade cristã do clero e dos fiéis que para lá acorreram com alimentação, roupas, apoio espiritual e psicológico. O Cardeal Orani conclamou toda população para buscar soluções dignas e formou uma Comissão mista que nunca foi atendida pelos responsáveis por esse abandono: O Prefeito e o Governador.
O judiciário, sempre lento em suas decisões, foi rápido no atendimento dos interesses de uma poderosa empresa de telefonia, que tanto trabalho tem dado os juízes por seu habitual desserviço à população, a Prefeitura e o Governo do Estado apresentaram-se para executar a ordem judicial com seu mais desrespeitoso aparato policial colocando toda violência no desalojamento dos sem teto, mas se omitiram quando foram chamados pelo Cardeal para um diálogo respeitoso.
Diante da ausência de respeito ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, o povo violentado foi bater na porta do Bispo. Este não só os acolheu como se dignou a fazer uma mediação na busca da solução que respeitasse o direito á habitação sem violência. Em plena semana santa os Palácios se fecharam e os detentores do pode lavaram as mãos.
O Cardeal, como Bom Pastor que é, colocou-se do lado dos mais necessitados, e, enfrentando as críticas daqueles que combate aqueles que clamam por respeito aos seus direitos, criminalizando-os, ofereceu aos desalojados do governo oito opções com dignidade, sob o manto protecional da Igreja, para que ocupem até que os responsáveis por essa violência se dignem cumprir sua obrigação de dar alojamentos dignos ao povo sem teto.
Após amplo diálogo com os desalojados, em que não faltou o enfrentamento aos anarco-punks, que apostavam na política do quanto pior melhor, tentando influenciar nas negociações dificultando-o ao máximo. Mas é preciso que num regime democrático todas essas opiniões sejam enfrentadas e debatidas com diálogo e não com a violência, única linguagem utilizada pelos governantes, sempre que alguém se rebela contra a opressão.
Final feliz. Por enquanto, no domingo em que a liturgia cristã identifica Cristo por sua forma de partilhar o pão, a Igreja soube partilhar com os menos favorecidos um de seus espaços, respeitando a dignidade da pessoa humana e praticando a caridade cristã.