Rio, eu te amo.

Siro Darlan, desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e Coordenador Rio da Associação Juízes para a democracia.

A emoção de ver o Rio de Janeiro retratado na tela do cinema é muito emocionante. Nós que habitamos nesse cenário espetacular nem sempre valorizamos a beleza e o encantamento que significa viver no Rio de Janeiro. Essa cidade foi esculpida pela natureza exuberante que desenhou a urbes com suas belezas naturais que nossos urbanistas souberam aproveitar com inteligência.

É claro que esse ambiente paradisíaco não foi projetado para comportar a quantidade de gente que habita o Rio, e esse fato tem causado problemas de locomoção, habitação e outros derivados dessa falta de planejamento. Contudo nada é capaz de desviar a atenção do cenário natural, maravilhosamente retratado no filme. A fotografia é inebriante e valoriza todos os ângulos possíveis, desde o alto das montanhas até as praias menos frequentadas, como é o caso da Ilha de Paquetá, um paraíso cercado de águas fétidas da poluição da Baia da Guanabara.

Essa imagem merece uma reflexão. Porque um paraíso colocado á disposição do homem não valoriza seus habitantes como deveria? O voo de aza delta ao redor do Cristo Redentor pelo ator Wagner Moura e que causou tanta polêmica marca muito bem o contraste entre o Deus nos brindou e o que nós transformamos com nosso egoísmo. A oração do ator, apesar de retratar a realidade contrastante, é injusta porque atribui à imagem do Cristo o mau uso do Paraíso pelo homem.

Assim como no Éden, o fato de termos sido dotados da liberdade de escolha que nos expulsou do paraíso, assim também aqui, na Cidade Maravilhosa, o presente divino continua à disposição do homem que insiste em tratar de forma diferente e preconceituosa os habitantes da urbe.

Outra demonstração de sensibilidade dos cineastas foi a trilha musical. Não podiam ter sido mais felizes. A música acompanha o molejo dos cariocas e o balanço das ondas do mar dando ao filme um ritmo inebriante. É uma felicidade dormir e acordar nessa Cidade maravilhosa, abençoada pelo redentor. Mas é preciso um investimento maior na autoestima do povo carioca para que nos vejamos como irmãos e não com as diferenças sociais gritantes que tanto nos separam uns dos outros.

Enfim, não há como deixar de reconhecer que um filme com um cenário que incorpora num mesmo cenário o Teatro Municipal, Cristo Redentor, Pão de Açúcar, Vidigal, Lapa, Estação Leopoldina, Pedra Bonita, Santa Teresa, Copacabana mostra a parte nobre e bonita da Cidade, mas reforça o preconceito tão bem descrito por Zuenir Ventura de que vivemos numa Cidade Partida, onde a beleza parece se confundir com a riqueza e o pobre é o feio. Ainda que toda cultura aqui plantada tenha como nascedouro a diversidade cultural e étnica que não foi tão bem retratada e valorizada no filme.