Prezados (as) Colegas,

 

Remeto, abaixo, o texto da impugnação ao Mandado de Segurança nº 33288, agora sob a relatoria do Ministro Luiz Fux e ainda sem apreciação do pedido liminar.

Cordialmente,

Nagib Slaibi

 

 

EXCELENTÍSSIMA SENHORA MINISTRA CARMEM LUCIA ANTUNES ROCHA – COLENDO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

 

 

 

 

Mandado de Segurança n. 33288

 

 

 

NAGIB SLAIBI FILHO, brasileiro, casado, magistrado, portador da carteira de identidade nº 080.917.809 (IFP), inscrito no CPF/MF sob o nº 186.569.867-91, com endereço na Av. Jornalista Alberto Francisco Torres, nº 413/701, Icaraí, Niterói, RJ, SIRO DARLAN DE OLIVEIRA, brasileiro, casado, magistrado, portador da carteira de identidade nº 2580343-8 (IFP), inscrito no CPF/MF sob o nº 288.637.207-20, com endereço na Estrada do Joá, nº 88/902, São Conrado, Rio de Janeiro, RJ, MARCUS QUARESMA FERRAZ, brasileiro, casado, magistrado, portador da carteira de identidade nº 19150648, inscrito no CPF/MF sob o nº 024.626.217-68, com endereço na Rua Ministro Luis Galotti, nº 305, Freguesia, Rio de Janeiro, RJ, GILBERTO CAMPISTA GUARINO, brasileiro, solteiro, magistrado, matrícula TJRJ nº 876, inscrito no CPF/MF sob o nº 337.221.377-72, com endereço na Buarque de Macedo, nº 05/704, Praia do Flamengo, Rio de Janeiro, RJ e JOSÉ ROBERTO PORTUGAL COMPASSO, brasileiro, casado, magistrado, portador da carteira de identidade nº 044326648-6 (IFP), inscrito no CPF/MF sob o nº 753.191.797-15, com endereço na Rua Álvaro Gonçalves, nº 70, Barra Mansa, RJ, vem, representados por seus advogados que a esta subscrevem (doc. 01 e 02),  respeitosamente, manifestar-se em

IMPUGNAÇÃO

nos autos do Mandado de Segurança n. 33288 impetrado pelo TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO (TJRJ), pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos:

 

 

I – INEXISTÊNCIA DE CONEXÃO

OBJETOS DISTINTOS E CAUSA DE PEDIR DIFERENTES

 

Alega o Impetrante que haveria conexão entre o presente Mandado de Segurança e a Reclamação nº 13115/RS, também em trâmite perante este Eg. Supremo Tribunal Federal.

 

A Reclamação nº 13115/RS, com a qual o presente mandamus seria alegadamente conexo, tem como causa de pedir a afronta às decisões proferidas nas ADIs nº 3566-DF, 3976-SP, 4108-MG e na Reclamação nº 9723. Neste aspecto, cumpre transcrever o pedido formulado naqueles autos, em textual:

 

“Pelas razões expostas, o reclamante requer, respeitosamente a Vossa Excelência:

1º – tendo em vista que a solenidade de posse dos eleitos está marcada para o dia 1º de fevereiro de 2012 e que se encontra amplamente demonstrado que no processo eleitoral se verificou flagrante violação ao que dispõe a Lei Complementar nº 35/79 e desrespeito ao que foi decidido por esse Egrégio Tribunal, inclusive na Reclamação nº 9723, CAUTELARMENTE, a sustação da posse de todos os eleitos, até o julgamento da presente reclamação;…

(…)

Requer ainda que a reclamação seja distribuída ao Exmo. Ministro Luiz Fux, relator da Reclamação 9723, tendo em vista que a razão da propositura da presente reside no descumprimento do que decidido naquela.” (doc. 03)

 

Já no presente Mandado de Segurança, o Impetrante, diversamente, pretende que seja reconhecida a incompetência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para processar e julgar os procedimentos administrativos iniciados pelos ora Impetrados. Em destaque a argumentação do Impetrante, em que se denota evidente que a causa de pedir é absolutamente distinta da referida Reclamação 13115/RS:

 

“Toda a tese exposta nos citados procedimentos em trâmite no Conselho Nacional de Justiça envolve a análise da constitucionalidade do estabelecido no art. 3º da Resolução TJ TP/RJ 01/2014. Os autores dos processos administrativos fundamentam seu pleito na ideia de que a Constituição Federal, no art. 93, definiu que cabe ao Estatuto da Magistratura definir as regras para as eleições para os cargos da administração do Poder Judiciário e que, por isso, uma norma administrativa regimental não poderia dispor sobre o tema. Dai decorreria a suposta inconstitucionalidade do dispositivo impugnado nos processos administrativos.

Contudo, o Conselho Nacional de Justiça não pode decidir se a norma regimental editada pelo Impetrante está em conformidade com a Constituição, em exercício de função jurisdicional.”

 

Considerando a causa de pedir acima transcrita, o Impetrado assim formulou o seu pedido no presente Mandado de Segurança:

 

“Requer, ainda, a concessão de ordem liminar, para que seja imediatamente suspensa a tramitação dos processos PP 0006166- 87.2014.8.00.0000; PCA 0006190-18.2014.2.00.0000 e PP 0006191- 03.2014.2.00.000, sustando-se a produção dos efeitos dos atos já praticados ou das decisões que venham a ser proferidas, pelo Conselho Nacional de Justiça nestes procedimentos administrativos, assegurando-se ao Impetrante a possibilidade de prosseguir com os procedimentos eletivos estabelecidos na Resolução TJ/TP/RJ nº 01/2014.

Requer, ao final, seja concedida a segurança para, ratificando-se a liminar concedida, sejam extintos e arquivados definitivamente os procedimentos que visem ao afastamento das normas regimentais impugnadas junto ao CNJ.”

 

 

Cristalino, assim, que as demandas não possuem, em absoluto, a identidade de pedido ou causa de pedir exigida pela expressa redação do artigo 103 do Código de Processo Civil, para que se possa falar em conexão.

 

Nota-se, portanto, que ainda que se admita a existência de um mero fato remoto comum entre as ações, tal fato não acarreta conexão entre elas. Afinal, repita-se: a conexão decorre da identidade da causa de pedir ou do pedido, também denominado “objeto”, de duas ou mais ações. É esta a redação expressa do artigo 103 do Código de Processo Civil, que é transcrita a seguir:

 

Art. 103 – Reputam-se conexas duas ou mais ações sempre que há identidade quanto lhes for comum o objeto ou a causa de pedir.

 

Ademais, se fosse para considerar a existência de alguma prevenção por força de conexão, o presente Mandado de Segurança seria conexo com o Mandado de Segurança nº 32.451 impetrado, tal como o presente, contra o Conselho Nacional de Justiça.

 

 

 

 

II – CONEXÃO COM O MS 32.451

MESMO OBJETO E IDÊNTICA CAUSA DE PEDIR

 

O Mandado de Segurança nº 32.451, da relatoria do Ministro Ricardo Lewandowski, foi impetrado pelo  Estado de São Paulo, representando o TJSP, “contra decisão proferida pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ, nos autos do Pedido de Providências 0005039-51.2013.2.00.0000.   A decisão ora impugnada ratificou, por maioria, liminar anteriormente deferida pelo Relator, Conselheiro Guilherme Calmon Nogueira da Gama, consistente na determinação de que o Tribunal paulista se abstivesse de dar abertura ao procedimento eleitoral para os seus cargos diretivos com fundamento na Resolução 606/2013/TJSP, haja vista o “aparente” confronto do mencionado normativo com o teor do artigo 102 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LC 35/1979).” (doc. 04)

 

É de se ressaltar que, exatamente como o presente Mandado de Segurança, o Impetrante daquele MS nº 32.451 alega que o CNJ teria extrapolado a sua competência ao proferir decisão em Pedido de Providências.  Há, sim, aqui, igualdade de causa de pedir e de pedido.  O referido Mandado de Segurança ainda está em tramitação, tendo sido apenas apreciada a liminar (doc. 05).

 

Portanto, considerando que a Reclamação nº 13.115 tem como causa de pedir a afronta às decisões proferidas nas ADIs nº 3566-DF, 3976-SP, 4108-MG e notadamente na Reclamação nº 9723, impossível reconhecer a suposta existência de conexão com o presente Mandado de Segurança, o qual pretende o arquivamento dos procedimentos administrativos em trâmite perante o CNJ, diante da alegada incompetência.  O pleito do Impetrante para que seja reconhecida a conexão entre estas duas causas merece ser, por conseguinte, rechaçado.

 

Por outro lado, verifica-se haver, sim, conexão com o Mandado de Segurança nº 32.451, da relatoria do Ministro Ricardo Lewandowski, o que ora requer seja reconhecido.

 

                  

III – DO LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO

 

É entendimento consolidado pela doutrina e pela jurisprudência que é impositiva, em sede de mandado de segurança, a formação de litisconsórcio passivo entre a autoridade impetrada e aqueles que serão afetados em caso de eventual decisão concessiva da ordem, ou seja, os beneficiários do ato reputado ilegal, sob pena de extinção do mandamus sem julgamento do mérito.

 

Referida imposição decorre de lei, especificamente dos termos do art. 24, da Lei n.º 12.016/2009 (“Art. 24.  Aplicam-se ao mandado de segurança os arts. 46 a 49 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civi”).

 

Por sua vez, dispõe o art. 47 do Código de Processo Civil, in verbis:

 

Art. 47. Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo.

Parágrafo único. O juiz ordenará ao autor que promova a citação de todos os litisconsortes necessários, dentro do prazo que assinar, sob pena de declarar extinto o processo.

 

Vê-se pela literal disposição de lei que a não citação de todos os litisconsortes passivos necessários impede a formação de relação processual válida e que, em conseqüência, a decisão de mérito não tem eficácia.

 

Assim, a não integração à lide dos litisconsortes passivos necessários torna nula a decisão quando influi nas relações jurídicas de quem não foi parte da ação mandamental. A ausência de citação de litisconsorte passivo necessário em sede de mandado de segurança, como na hipótese sub judice, e, nos termos do art. 24, da Lei n.º 12.016/2009, enseja a aplicação do entendimento cristalizado pela Súmula 631 do Supremo Tribunal Federal:

Sumula 631:  EXTINGUE-SE O PROCESSO DE MANDADO DE SEGURANÇA SE O IMPETRANTE NÃO PROMOVE, NO PRAZO ASSINADO, A CITAÇÃO DO LITISCONSORTE PASSIVO NECESSÁRIO.

 

CELSO AGRÍCOLA BARBI[1], em lição muito presente na jurisprudência, explica que “toda vez que o mandado de segurança implicar modificação da posição jurídica de outras pessoas, que foram diretamente beneficiadas pelo ato impugnado, ou, mais precisamente, quando a sentença modificar direito subjetivo criado pelo ato impugnado pelo favor de outras pessoas, haverá litisconsórcio necessário, e a sentença não poderá ser dada sem que esses terceiros sejam citados como partes passivas na ação.”

 

No caso dos autos, o Impetrante pleiteia como medida liminar que seja suspensa a tramitação dos processos PP 0006166-87.2014.2.00.0000, apresentado pelos ora Impugnantes, PCA 0006190-18.2014.2.00.0000, apresentado pelo Sindicato dos Titulares de Serventias, Ofícios de Justiça e Similares do Estado do Rio de Janeiro – SINTERJ e PP 0006191-03.2014.2.00.0000, apresentado pelo Desembargador aposentado Thiago Ribas Filho, todos perante o Egrégio Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e, como segurança, que os referidos procedimentos sejam extintos e arquivados definitivamente.

 

Ora, por natural obviedade, caso seja concedida a liminar ou a segurança pleiteada, o que não se espera, os ora Impugnantes e os demais autores desses procedimentos administrativos serão diretamente afetados, sofrendo modificação de sua posição jurídica.

 

Ademais, este Colendo Supremo Tribunal Federal terá que decidir a lide de modo uniforme para todas as partes, sob pena de violação ao princípio da isonomia.

 

Pelo exposto, os ora Impugnantes, autores do Pedido de Providências n. 0006166-87.2014.2.00.0000 objeto do presente mandamus, requerem a sua admissão e ingresso nos presentes autos na qualidade de litisconsortes passivos necessários, bem como requerem a esta douta Ministra Relatora seja assinado prazo para que o Impetrante requeira e promova a citação dos demais litisconsortes passivos necessários (Sindicato dos Titulares de Serventias, Ofícios de Justiça e Similares do Estado do Rio de Janeiro – SINTERJ e Desembargador aposentado Thiago Ribas Filho), sob pena de declarar extinto o processo.

 

 

IV – DESCABIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA

TENTATIVA DE VIOLAÇÃO DE ACESSO À JUSTIÇA, DIREITO DE AÇÃO E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL

 

Ao declarar constitucional a instituição do Conselho Nacional de Justiça, no julgamento da ADI 3.367 em 2005, este Colendo Supremo Tribunal Federal reconheceu a competência do Conselho como “Órgão interno de controle administrativo, financeiro e disciplinar da magistratura”. O senhor Ministro Cezar Peluso, então relator do julgado, bem ressaltou em seu voto, “Entre nós, é coisa notória que os atuais instrumentos orgânicos de controle ético-disciplinar dos juízes, porque praticamente circunscritos às corregedorias, não são de todo eficientes, sobretudo nos graus superiores de jurisdição”. Para o relator da ADI, “o Conselho não anula, reafirma o princípio federativo”. E conclui: “O Judiciário necessita de um órgão nacional de controle, que receba as reclamações contra as atividades administrativas dos juízes e tribunais, assim como contra a qualidade do serviço judicial prestado”.

 

Dessa forma, o Conselho Nacional de Justiça é instituição  de matriz constitucional, que possui competência para efetuar o controle ético-disciplinar da magistratura.

 

O presente Mandado de Segurança é uma lamentável tentativa do E. TJRJ de tolher a atuação do Eg. Conselho Nacional de Justiça e impedir que os Impetrados ora impugnantes tenham acesso à Justiça e exerçam o seu direito de ação, na medida em que pretende impedir o processamento de um procedimento de controle externo do Judiciário (Pedido de Providências), devidamente previsto na Constituição Federal.

 

O artigo 103-B, § 4º, da Constituição Federal atribui ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) competência para o controle da atuação administrativa e financeira do Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos seus juízes, in verbis:

 

“§4º Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura:

 

 

I – zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências;”

 

Nos termos da norma constitucional, portanto, compete ao Conselho Nacional de Justiça, no exercício de suas funções como órgão de controle administrativo do Poder Judiciário, zelar pela legalidade e higidez das eleições para preenchimento dos cargos de direção dos tribunais, precipuamente se estas violam a LOMAN, que é o Estatuto da Magistratura em vigor.

 

Assim foi que os ora Impetrados apresentaram o Pedido de Providências n. 0006166-87.2014.2.00.0000 que tem por objeto a alteração do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que possibilitou, em flagrante violação à Lei Orgânica da Magistratura – LOMAN (Lei Complementar 35/1979), reeleição de Desembargador para cargo de direção do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (doc. 06)

 

Muito ao revés do que alega o Impetrante TJRJ, não se cuida o referido Pedido de Providências de invocação de controle de constitucionalidade, mas sim de “flagrante violação ao art. 102 da LOMAN”.

 

Ao contrário, foi o TJRJ, ora Impetrante, que em sua defesa apresentada naquele Pedido de Providências, veio a alegar que “a análise do tema discutido nestes autos deve ser precedida de decisão a respeito da recepção do art. 102 da LOMAN pela Constituição de 1988”.  (doc. 07).  Portanto, a invocação de controle de constitucionalidade foi feita pelo TJRJ, e não pelos Autores do Pedido de Providência.

 

Em verdade, somente a falta de independência e o descumprimento da lei na atuação administrativa e em questões interna corporis relacionadas às regras e normas do sistema eleitoral para os cargos de direção do TJRJ fundamentam o Pedido de Providências n. 0006166-87.2014.2.00.0000.

 

Infelizmente, no caso do TJRJ, a política – inerente a qualquer processo eleitoral – deu lugar à politicagem e à ilegalidade, maculando o processo eleitoral para cargos de direção do TJRJ, o que impôs a necessidade da interferência do Conselho Nacional de Justiça, nos exatos termos de sua competência estabelecida pela Constituição Federal.

 

Conforme se verá a seguir, o Mandado de Segurança impetrado pelo TJRJ é uma tentativa velada de extirpar tanto a competência do CNJ quanto o direito de ação e ao acesso à Justiça dos ora Impetrados, o que requer seja vedado exemplarmente por esta Suprema Corte.

 

V – PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS ADSTRITO À COMPETÊNCIA DO CNJ

DA FLAGRANTE ILEGALIDADE DA RESOLUÇÃO TJ/TP/RJ n. 01/2014

 

Primeiramente, cumpre ressaltar que o Impetrante deixou de informar e esclarecer que a sessão do Tribunal Pleno do TJRJ realizada em 21.08.2014 somente submeteu aos respectivos membros um questionário de opções que, embora versando sobre o Regimento Interno, se apresentava sob forma de múltipla escolha, jamais sendo submetido, até a data de hoje, qualquer texto do referido Regimento.

 

Não há, assim, até a presente data, qualquer texto de Regimento Interno submetido e/ou aprovado pelo Plenário do TJRJ. Assim, o artigo 3º Resolução TJ/TP/RJ n. 01/2014, impugnado pelo Pedido de Providências n. 0006166-87.2014.2.00.0000, é oriundo tão-somente de um quesito aprovado por 84 votos contra 61, não atingindo a maioria absoluta de 91 votos exigida pelo Regimento Interno em vigor, sendo patente, portanto, a insuficiência do quórum alcançado.

 

Portanto, em decorrência do resultado da votação dos quesitos de múltipla escolha, foi editada a Resolução TJ/TP/RJ n. 01/2014, sem que sua redação tenha sido submetida à apreciação do Tribunal Pleno.

 

A despeito dessa ilegalidade formal, gravíssimo é o conteúdo da Resolução TJ/TP/RJ n. 01/2014, cujo comando veio a alterar o Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro de forma flagrantemente ilegal, na medida em que passou a permitir a reeleição de Desembargador para o mesmo cargo da Administração Superior do TJRJ.

 

Qualquer disposição de Regimento Interno – e relembre-se que o assim chamado pelo TJRJ sequer chegou a ser submetido ao Tribunal Pleno – destoante das regras postas imperativamente pela LOMAN viola frontalmente a hierarquia das normas jurídicas, não se podendo conceber, quando este próprio Colendo Supremo Tribunal Federal afirmou por inúmeras vezes a recepção da Lei Complementar Federal nº 35/79, inclusive de seu artigo 102, pela Constituição/88, uma colcha de retalhos de Regimentos Internos dos diversos tribunais dispondo cada um de maneira diversa sobre o mesmo tema.

 

A Resolução TJ/TP/RJ n. 01/2014, em seu artigo 3º, assim estabeleceu:

 

“O TRIBUNAL PLENO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, no âmbito de sua competência e no uso de suas atribuições legais e regimentais e tendo em vista o que foi decidido na sessão do dia 21 de agosto de 2014 (Processo n. 0034509-64.2014.8.18.0000), RESOLVE:

(…)

Art. 3º Poderá o Desembargador ser novamente eleito para o mesmo cargo, desde que observado o intervalo entre dois mandatos.”

 

 

A autorização para reeleição de cargos da Alta Direção do TJRJ deixa entrever estar-se visando a situações específicas de um ou mais Desembargadores interessados em uma reeleição ou recondução.

 

Ocorre que a norma do artigo 3º viola o comando legal contido no artigo 102 da Lei Complementar 35/79, no sentido de expressamente proibir a reeleição para quaisquer cargos de direção dos Tribunais:

 

“Art. 102 – Os Tribunais, pela maioria dos seus membros efetivos, por votação secreta, elegerão dentre seus Juízes mais antigos, em número correspondente ao dos cargos de direção, os titulares destes, com mandato por dois anos, proibida a reeleição. Quem tiver exercido quaisquer cargos de direção por quatro anos, ou o de Presidente, não figurará mais entre os elegíveis, até que se esgotem todos os nomes, na ordem de antigüidade. É obrigatória a aceitação do cargo, salvo recusa manifestada e aceita antes da eleição.

Parágrafo único – O disposto neste artigo não se aplica ao Juiz eleito, para completar período de mandato inferior a um ano.”

 

 

Ressalte-se que o legislador prestigiou a renovação na alta direção dos Tribunais, tanto que proíbe a recondução ou reeleição do desembargador que tenha exercido o cargo de presidente, a despeito de ter havido ou não intervalo entre os mandatos.  Evidente, portanto, a ilegalidade do artigo 3º da Resolução TJ/TP/RJ n. 01/2014.

 

 

 

 

Como se vê, o comando insculpido na Lei Complementar 35/79 é expresso e claro ao proibir que aquele membro dos tribunais, que já tenha exercido cargo de Presidente, não poderá recandidatar-se, causa de inelegibilidade, excluída a hipótese, lógico, se esgotado todos os nomes na ordem de antiguidade.

 

Da mesma forma, a Lei Complementar 35/79 é expressa ao estabelecer que membros dos tribunais, que já tenham exercido cargos diretivos por quatro anos, também não poderão recandidatar-se, tornando-se inelegíveis.

 

A despeito da clareza da lei, por mais de uma vez já se verificou a tentativa de ex-presidentes de Tribunais retornarem ao mesmo cargo, tendo havido firmeza nas decisões deste Colendo Supremo Tribunal Federal no sentido de prestigiar a alternância de poder e proibir a reeleição:

 

“Art. 102 da Loman. Condições de elegibilidade para cargo de direção em tribunal. Inelegibilidade configurada com exercício de dois mandatos, ainda que incompletos. (…) O art. 102 da Loman, ao se referir à inelegibilidade daqueles que exerceram cargos de direção ‘por quatro anos’, deve ser entendido como ‘por dois mandatos’. Assim, o exercício de dois mandatos em cargo de direção no tribunal torna o desembargador inelegível, salvo se não houver outros desembargadores elegíveis ou que aceitem o cargo.”

(STF – MS 27.593, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 1º-7-2010, Plenário, DJE de 8-10-2010.)

 

 

 

“1. A eleição para o preenchimento dos cargos de direção dos Tribunais de Justiça dos Estados é disciplinada pelo artigo 102 da Lei Complementar n. 35/79 (LOMAN), recebida pela atual ordem constitucional (CF, artigo 93).  2. Os Regimentos Internos dos Tribunais podem explicitar os meios para a sua realização, desde que obedecidos os limites e parâmetros estabelecidos na lei.  3. Neles é vedada, contudo, a inclusão de instruções sobre o processo eleitoral interno que ultrapassem as regras básicas da lei complementar.  4. Inconstitucionalidade do segundo período do §4º do artigo 11 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.”

(ADI 1503 – Rel. Min. MAURÍCIO CORREA – Tribunal Pleno – DJ 18.05.2001)

 

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. REGIMENTO INTERNO DO TJ/PE. RECONDUÇÃO DE MEMBROS DO CONSELHO DA MAGISTRATURA. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. Até o advento da lei complementar prevista no artigo 93, caput, da Constituição de 1988, o Estatuto da Magistratura será disciplinado pelo texto da Lei Complementar n. 35/79, que foi recebida pela Constituição. Precedentes. 2. A regra contemplada no artigo 102 da LOMAN, que cuida dos mandatos dos membros dos órgãos colegiados de direção, proíbe a recondução. 3. Pedido de declaração de inconstitucionalidade julgado procedente.
(ADI 1985, Rel.  Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, j. 03/03/2005, DJ 13-05-2005)

 

 

“Se os cargos de direção da Corte estadual são três: Presidente, Vice-Presidente e Corregedor-Geral da Justiça, o Tribunal deve eleger os respectivos titulares, dentre seus três Desembargadores mais antigos, observada a segunda parte do aludido dispositivo, qual seja, quem tiver exercido quaisquer cargos de direção por quatro anos, ou o de Presidente, não figurará mais entre os elegíveis, até que se esgotem todos os nomes, na ordem de antigüidade. De acordo com a parte final do art. 102, da LOMAN, é obrigatória a aceitação do cargo, salvo recusa manifestada e aceita antes da eleição. Não são elegíveis, para Presidente, Vice-Presidente ou Corregedor-Geral da Justiça, Desembargadores, não situados entre os três mais antigos da Corte, que ainda não exerceram a Presidência. Hipótese em que os eleitos, para Vice-Presidente e Corregedor-Geral da Justiça, não se encontravam nessa situação. Violação ao art. 102, da LOMAN”. (RE nº 105.082, Rel. Min. Néri da Silveira, in RTJ 124/304)

 

 

“RECLAMAÇÃO. IMPUGNAÇÃO. ATO DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO. ELEIÇÃO PARA O CARGO DE PRESIDENTE. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DECORRENTE DA NÃO OBSERVÂNCIA DO UNIVERSO DOS ELEGÍVEIS. ALEGAÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DA DECISÃO DA ADI N. 3.566. FRAUDE À LEI. FRAUDE À CONSTITUIÇÃO. NORMAS DEFINIDORAS DO UNIVERSO DE MAGISTRADOS ELEGIVÉIS PARA OS ÓRGÃOS DIRETIVOS DOS TRIBUNAIS. NECESSIDADE DE RENOVAÇÃO DOS QUADROS ADMINISTRATIVOS DOS TRIBUNAIS. DETERMINAÇÃO CONTIDA NA SEGUNDA PARTE DO ARTIGO 102 DA LOMAN. CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE E CAUSA DE INEGIBILIDADE. RECLAMAÇÃO JULGADA PROCEDENTE. 1. Impugnação de ato do Tribunal Regional Federal da 3ª Região concernente à eleição para o cargo de Presidente daquele Tribunal. 2. Discussão a propósito da possibilidade de desembargador que anteriormente ocupou cargo diretivo por dois biênios no TRF da 3ª Região ser eleito Presidente. 3. Afronta à decisão proferida na ADI n. 3.566 — recepção e vigência do artigo 102 da Lei Complementar federal n. 35 – LOMAN. 4. Desembargador que exerceu cargo de Corregedor-Geral no biênio 2003-2005 e eleito Vice-Presidente para o biênio 2005-2007. Situação de inelegibilidade decorrente da vedação do art. 102, da LOMAN, segunda parte. 5. A incidência do preceito da LOMAN resulta frustrada. A fraude à lei importa, fundamentalmente, frustração da lei. Mais grave se é à Constituição, frustração da Constituição. Consubstanciada a autêntica fraus legis. 6. A fraude é consumada mediante renúncia, de modo a ilidir-se a incidência do preceito. 7. A renovação dos quadros administrativos de Tribunais, mediante a inelegibilidade decorrente do exercício, por quatro anos, de cargo de direção, há de ser acatada. 8. À hipótese aplica-se a proibição prevista na segunda parte do artigo 102, da LOMAN. 9. O artigo 102 da LOMAN traça o universo de magistrados elegíveis para esses cargos, fixando condição de elegibilidade (critério de antiguidade) e causa de inelegibilidade (quem tiver exercido quaisquer cargos de direção por quatro anos, ou o de Presidente). O universo de elegíveis é delimitado pela presença da condição de elegibilidade e, concomitantemente, pela ausência da causa de inelegibilidade. Normas regimentais de Tribunais que, de alguma forma, alterem esses critérios violam o comando veiculado pelo artigo 102 da LOMAN. Pedido julgado procedente.”

(Rcl 8025, Rel.  Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, j. 09/12/2009, DJ 06-08-2010) Vide: ADI 3.566, Rel. p/ o ac. Min. Cezar Peluso, julgamento em 15-2-2007, Plenário, DJ de 15-6-2007.

 

 

O Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, ao adotar, em seu regimento interno, um critério próprio de especificação do número de membros aptos a concorrerem aos seus cargos de direção, destoou do modelo previsto no art. 102 da legislação nacional vigente, a Lei Complementar 35/79 (LOMAN). 3. O Plenário do Supremo Tribunal Federal já fixou entendimento no sentido de que o regramento relativo à escolha dos ocupantes dos cargos diretivos dos tribunais brasileiros, por tratar de tema eminentemente institucional, situa-se como matéria própria de Estatuto da Magistratura, dependendo, portanto, para uma nova regulamentação, da edição de lei complementar federal, nos termos do que dispõe o art. 93 da Constituição Federal. Plausibilidade jurídica e perigo na demora existentes. 4. Deferimento de medida cautelar integralmente referendado pelo Plenário.”
(ADI 4108-MC,  Rel.  Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, j. 02/02/2009, DJ 06-03-2009)

 

 

Em seu voto externado na sessão do Tribunal Pleno que julgou a ADI 3566, o douto Ministro CEZAR PELUSOexaminou e decidiu sobre a impossibilidade das normas regimentais contrariarem o art. 102 da LOMAN, inclusive aquelas que pretendem alterar a causa de inelegibilidade, in verbis:

 

“O universo dos elegíveis e as condições de elegibilidade são matérias institucionais, que constituem, a meu ver, matérias típicas do objeto constitucional do Estatuto da Magistratura, que, além disso, deve obedecer aos princípios do art. 96. (…) Então se a matéria é objeto típico do Estatuto da Magistratura, a conclusão imediata é que não pode ser objeto de disposições de caráter regimental. (…)

 

Acresça-se a isso o decidido no julgamento do MS 32451 MC, de relatoria do Ministro LEWANDOWSKI, no qual este E. STF expressou de forma cristalina e vinculante que o art. 102 da LOMAN foi recepcionado em sua maior parte pela Constituição, e que, nesse quadro, permanecem vedados não só a reeleição como o exercício de quaisquer cargos de direção em tribunais por período superior a 4 (quatro) anos, sequencial ou alternado.

 

Vale frisar que as decisões emanadas do CNJ, sempre dentro do limite de sua competência, são consentâneas, por óbvio, com as decisões proferidas pelo STF, não havendo nenhuma decisão que destoe da impossibilidade de reeleição e da impossibilidade de recandidatura para ex-presidentes dos TJs:

 

“De fato, este Conselho não pode negar aplicabilidade ao art. 102 da Loman, ao menos na parte em que proíbe expressamente a reeleição para os cargos de direção dos tribunais.

Não desconhecemos que a questão do universo dos membros elegíveis para tais cargos ainda é controversa na jurisprudência. A nosso juízo, todavia, a proibição da reeleição é norma de caráter objetivo, não alcançada pelas discussões havidas até o momento nos Tribunais Superiores e neste Conselho Nacional.

Nesse passo, há de se presumir a constitucionalidade do dispositivo legal, sendo imperiosa a sua aplicação.

Ante todo o exposto, julgo parcialmente procedente o pedido nos termos da limar deferida (evento 20), firmando o entendimento acerca da impossibilidade de reeleição para cargo de direção de Tribunal, nos termos do art. 102 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional, determinando o arquivamento do presente do Pedido de Providências com fundamento do inciso X do art. 25 do Regimento Interno do CNJ.” (CNJ – Pedido de Providências nº  0006153-25.2013.2.00.0000 – Conselheiro FABIANO SILVEIRA – julgado em no dia 14.10.2014) (doc. @)

 

 

Exatamente no mesmo sentido, foi proferida a liminar pelo eminente Conselheiro PAULO TEIXEIRA nos autos do Pedido de Providências n.  0006166-87.2014.2.00.0000, cuja regular tramitação o presente Mandado de Segurança pretende obstar:

 

“A celeuma gira em torno da possibilidade de reeleição de desembargador para cargo de direção do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.

A controvérsia acentuou-se a partir da edição da Resolução TJ/TP/RJ n. 01/2014 alterou os critérios de inelegibilidade para cargos diretivos no âmbito do TJRJ, e, em seu terceiro artigo trouxe justamente a possibilidade de reeleição desembargador para o mesmo cargo, desde que observado o intervalo entre dois mandatos.

O artigo 102 da Lei 35/1979 – LOMAN, que estabelece o universo de magistrados elegíveis para os cargos de direção nos Tribunais, também fixou condições de elegibilidade e causas de inelegibilidade, dentre estas, o fato de ter o magistrado exercido cargo de direção (…)

É truísmo que o legislador inspirou-se no princípio da alternância do preenchimento dos cargos de direção, de modo a evitar, inclusive, que magistrados afastem-se de suas funções judicantes (que são suas atribuições finalísticas) por longos períodos.

Há precedentes do Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça e deste Conselho em sentido diametralmente oposto ao que restou resolvido pelo tribunal requerido (art. 3º, Res. TJ/TP/RJ n. 01/2014). Ou seja, parece-me que o referido dispositivo realmente constitui ato contrário à lei e aos princípios que a inspiraram. (…)

Com os fundamentos expostos, concedo a liminar requerida para suspender os efeitos do art. 3º, da Resolução TJ/TP/RJ n. 01/2014, tendo em vista a proibição de reeleição constante do caput do art. 102 da Loman.”

 

Pela simples leitura, nota-se que a atuação do CNJ está absolutamente dentro de sua competência, não havendo o menor indício de exame de constitucionalidade ou violação da autonomia do TJRJ.

 

O fato é que o art. 102 da LOMAN estabelece o universo de magistrados elegíveis para os cargos de direção nos Tribunais, fixando condições de elegibilidade e causa de inelegibilidade (já ter exercido cargo de direção).  Normas regimentais de Tribunais que, de alguma forma, alterem esses critérios, violam o comando contido no artigo 102, e podem ser objeto da atuação e competência do CNJ.

 

Indubitável, portanto, que a Resolução TJ/TP/RJ n. 01/2014 contraria não só a LOMAN, em seu artigo 102, bem como o entendimento já consolidado deste Colendo STF, segundo o qual as matérias atinentes à definição do universo dos desembargadores elegíveis e às condições de sua elegibilidade são tipicamente institucionais e, portanto, reservadas constitucionalmente à competência material do Estatuto da Magistratura (CF, art. 93, caput) – hoje, objeto da Lei Orgânica da Magistratura Nacional –, apto a estabelecer disciplina de alcance nacional e caráter uniforme àqueles temas.

 

No caso da reeleição, da suposta recondução ou mesmo em outras situações quaisquer, haveria possibilidade de inúmeros regramentos diferenciados, na hipótese sendo difícil perquirir o que sobraria à normatividade da LOMAN, possivelmente reduzida a pó. Data vênia, a pretensa recondução nada mais é do que uma modalidade da vedada reeleição, constituindo invenção semântica sem significado jurídico próprio.

 

 

 

E não se diga, como tenta fazer crer o Impetrante, que se estaria discutindo perante o CNJ a garantia do autogoverno que detém o Poder Judiciário. Não é esse o objeto do Pedido de Providências, nem esse argumento fundamenta o pleito final.  O objeto do Pedido de Providências n. 0006166-87.2014.2.00.0000 é justamente a prática de ilegalidade no exercício do autogoverno, e isso, a todas as luzes, não é permitido ao Poder Judiciário.

 

 

Inclusive, este Colendo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL já teve oportunidade de se manifestar, por mais de uma vez, sobre os limites do autogoverno e da autonomia concedida ao Poder Judiciário, os quais esbarram e devem respeitar a lei e a Carta Magna. A obviedade de tal limitação não demandaria digressão maior, não fossem os excessos capitaneados pela política que permeia a sucessão dos cargos diretivos dos Tribunais, de modo que vale transcrever o voto do ilustre Ministro DIAS TOFFOLI, relator do MS 28.447, verbis:

 

“A prerrogativa de elaborar o Estatuto da Magistratura, cometida ao STF pelo constituinte originário (art. 93, caput, CF/1988), tem função constritiva da liberdade nomogenética dos tribunais. Há reserva constitucional para o domínio de lei complementar no que concerne ao processo eleitoral nos tribunais, estando a caracterização dos loci diretivos, para fins de elegibilidade, adstrita aos três cargos, dispostos em numerus clausus, no art. 99 da LOMAN. Não se encarta no poder nomogenético dos tribunais dispor além do que prescrito no art. 102 da LOMAN, no que se conecta aos requisitos de elegibilidade. A departição de funções, nomes jurídicos ou atribuições, nos regimentos internos dos tribunais, não pode ser excogitado como critério diferenciador razoável e susceptível de quebra da isonomia entre os postulantes de cargo diretivo.” (MS 28.447, Rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 25-8-2011, Plenário, DJE de 23-11-2011.)

 

E foi justamente a função maior e primordial do CNJ, estabelecida pela Constituição Federal, que foi chamada agir por meio do Pedido de Providências n. 0006166-87.2014.2.00.0000 – fiscalizar os limites e legalidades dos atos praticados pelos Tribunais em seus autogovernos.  O Ministro CÉZAR PELUSO, relator da ADI 3367, bem destacou em seu voto:

 

“De modo que, sem profanar os limites constitucionais da independência do Judiciário, agiu dentro de sua competência reformadora o poder constituinte derivado, ao outorgar ao Conselho Nacional de Justiça o proeminente papel de fiscal das atividades administrativa e financeira daquele Poder. A bem da verdade, mais que encargo de controle, o Conselho recebeu aí uma alta função política de aprimoramento do autogoverno do Judiciário, cujas estruturas burocráticas dispersas inviabilizam o esboço de uma estratégia político-institucional de âmbito nacional. São antigos os anseios da sociedade pela instituição de um órgão superior, capaz de formular diagnósticos, tecer críticas construtivas e elaborar programas que, nos limites de suas responsabilidades constitucionais, dêem respostas dinâmicas e eficazes aos múltiplos problemas comuns em que se desdobra a crise do Poder.”

 

 

Ademais, a fundamentação utilizada pelo TJRJ no presente Mandado de Segurança ora impugnado está, com todas as vênias, desatualizada.  A bem da verdade, o posicionamento manifestado pelo ilustre Ministro CELSO DE MELLO em seu voto como relator da ADI 189, julgada em 1992, no sentido de que o exercício do autogoverno pelo Poder Judiciário seria imediato e prescindiria de regulamentação por futuro Estatuto da Magistratura, já está ultrapassado e superado, conforme se verifica dos diversos julgados subseqüentes e recentes:

 

“Parágrafos 2º e 3º do art. 100 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Eleição dos membros aspirantes aos cargos de direção da Corte Estadual de Justiça (…). O Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, ao adotar, em seu regimento interno, um critério próprio de especificação do número de membros aptos a concorrerem aos seus cargos de direção, destoou do modelo previsto no art. 102 da legislação nacional vigente, a LC 35/1979 (Loman). O Plenário do STF já fixou entendimento no sentido de que o regramento relativo à escolha dos ocupantes dos cargos diretivos dos tribunais brasileiros, por tratar de tema eminentemente institucional, situa-se como matéria própria de Estatuto da Magistratura, dependendo, portanto, para uma nova regulamentação, da edição de lei complementar federal, nos termos do que dispõe o art. 93 da CF.(ADI 4.108-MC-REF, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 2-2-2009, Plenário, DJE de 6-3-2009.)

 

“Consideração do tempo de exercício da advocacia privada para fins de classificação pelo critério de antiguidade na carreira da magistratura, da mesma forma em que se considera o tempo de serviço público. Alegada violação ao art. 93 da CF. Até a edição da lei complementar prevista no art. 93, caput, da CF, compete exclusivamente à Loman dispor sobre a promoção, a remoção e o acesso de magistrados aos cargos. (…) Medida cautelar deferida para suspender, com eficácia ex tunc, a vigência do art. 92, III, e, da Constituição do Estado de Mato Grosso, com a redação determinada pela EC 46/2006.” (ADI 4.042-MC, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 26-6-2008, Plenário, DJE de 30-4-2009.) No mesmo sentido: MS 30.647-MC-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 22-6-2011, Plenário, DJE de 6-8-2013.  ADI 4.462-MC, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 29-6-2011, Plenário, DJE de 16-11-2011.

 

“Magistratura. Tribunal. Membros dos órgãos diretivos. Presidente, vice-presidente e corregedor-geral. Eleição. Universo dos magistrados elegíveis. Previsão regimental de elegibilidade de todos os integrantes do Órgão Especial. Inadmissibilidade. Temática institucional. Matéria de competência legislativa reservada à Loman e ao Estatuto da Magistratura. Ofensa ao art. 93, caput, da CF. Inteligência do art. 96, I, a, da CF. Recepção e vigência do art. 102 da LC federal 35, de 14-3-1979 – Loman. Ação direta de inconstitucionalidade julgada, por unanimidade, prejudicada quanto ao § 1º, e, improcedente quanto ao caput, ambos do art. 4º da Lei 7.727/1989. Ação julgada procedente, contra o voto do relator sorteado, quanto aos arts. 3º, caput, e 11, I, a, do Regimento Interno do TRF 3ª Região. São inconstitucionais as normas de regimento interno de tribunal que disponham sobre o universo dos magistrados elegíveis para seus órgãos de direção.” (ADI 3.566, Rel. p/ o ac. Min. Cezar Peluso, julgamento em 15-2-2007, Plenário, DJ de 15-6-2007.) No mesmo sentido: ADI 3.976-MC, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 14-11-2007, Plenário, DJE de 15-2-2008; Rcl 5.158-MC, Rel. Min. Cezar Peluso, julgamento em 28-6-2007, Plenário, DJ de 24-8-2007; ADI 1.152-MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 10-11-1994, Plenário, DJ de 3-2-1997; ADI 841-QO, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 21-9-1994, Plenário, DJ de 21-10-1994. Vide: Rcl 8.025, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 9-12-2009, Plenário, DJE de 6-8-2010.

 

 

 

“Até o advento da lei complementar prevista no art. 93, caput, da Constituição de 1988, o Estatuto da Magistratura será disciplinado pelo texto da LC  35/1979, que foi recebida pela Constituição.” (ADI 1.985, Rel. Min.Eros Grau, julgamento em 3-3-2005, Plenário, DJ de 13-5-2005.)No mesmo sentido: ADI 2.580, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 26-9-2002, Plenário, DJ de 21-2-2003; AO 185, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 17-6-2002, Plenário, DJ de 2-8-2002.

“Lei 2.432, de 6-9-1995, do Estado do Rio de Janeiro, que deu nova redação aos § 1º e § 2º do art. 18 do Código de Organização e Divisão Judiciárias do mesmo Estado. Incompatibilidade com a norma do art. 93 da CF, por regular matéria própria do Estatuto da Magistratura, reservada, no dispositivo constitucional mencionado, à lei complementar federal.” (ADI 1.422, Rel. Min. Ilmar Galvão, julgamento em 9-9-1999, Plenário, DJ de 12-11-1999.)

“Regimento interno do TRT 1ª Região, com a redação dada pela Emenda Regimental 1/1993. Forma de preenchimento dos cargos diretivos do Tribunal. Definição das condições de elegibilidade. Matéria sujeita ao domínio normativo de lei complementar (CF, art. 93). Inviabilidade de tratamento normativo autônomo em sede regimental.” (ADI 1.152-MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 10-11-1994, Plenário, DJ de 3-2-1995.)

“O art. 102 da Loman, que disciplina a eleição dos cargos de direção dos tribunais e fixa o período do mandato em dois anos, foi recebido pela Constituição de 1988. Precedente do STF: MS 20.911-PA, Rel. Min. Octavio Gallotti, RTJ 128/1141. A matéria é, portanto, própria do Estatuto da Magistratura. CF, art. 93.” (ADI 841-QO, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 21-9-1994, Plenário, DJ de 21-10-1994.)

Portanto, a autonomia e o autogoverno do Poder Judiciário se sujeitam às normas constitucionais e legais em vigor e aplicáveis à hipótese, no caso a LOMAN, de forma que qualquer ato praticado sob o manto dessa garantia de autogoverno encontra limitação nas regras nela estabelecidas, que não podem ser contrariadas.

 

Ademais, o estabelecimento de normas internas para autogoverno, configura e consubstancia atuação administrativa do TJRJ, a qual está sujeita ao controle do Conselho Nacional de Justiça, nos termos do artigo 103-B, § 4º, da Constituição Federal.  Mais do que isso, considerando que essa atuação administrativa viola frontalmente a LOMAN, também é da competência do CNJ zelar pelo seu cumprimento, podendo recomendar providências, nos exatos termos que autoriza o inciso I do referido §4º.

 

 

VI – AUSÊNCIA DOS PRESSUPOSTOS PARA CONCESSÃO TANTO DA LIMINAR QUANTO DA SEGURANÇA

 

A Lei 12.016/2009 que trata do mandado de segurança, no § 1º de seu art. 1º, estabelece os requisitos para a concessão da segurança, quais sejam, haver direito líquido e certo do impetrante e ter ocorrido ilegalidade ou abuso de poder pela autoridade:

 

“Art. 1º Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça.”

 

No caso dos autos, o Impetrante requereu o deferimento de liminar bem como sua confirmação com a concessão da segurança para obter provimento judicial que tolha a atuação do CNJ e vede o direito de ação e o acesso dos ora Impetrados ao Eg. Conselho. Contudo, os dois únicos argumentos que traz o Impetrante (ter havido invocação de controle de constitucionalidade e violação à autonomia do Poder Judiciário) são desprovidos de veracidade não havendo, portanto, fundamentação fática e jurídica que embase o pleito de concessão da segurança.

 

Conforme amplamente demonstrado, o Pedido de Providências n. 0006166-87.2014.2.00.0000 foi formulado nos exatos limites da competência do CNJ.  Não há qualquer embasamento legal a justificar a segurança pleiteada, na medida em que a fundamentação do Pedido de Providências é exclusivamente a ilegalidade do ato praticado pelo TJRJ.  O pedido final formulado pelos ora Impetrados no referido procedimento em curso perante o CNJ é a prova cabal de que a argumentação do Impetrante carece de fundamentação e merece ser rechaçada:

 

“pleiteiam os Requerentes seja julgado procedente o presente Pedido de Providências, confirmando a liminar antes deferida, para reconhecer a impossibilidade de reeleição para cargo de direção de Tribunal, nos termos do art. 102 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional, afastando, assim, em definitivo os efeitos do artigo 3º da Resolução TJ/TP/RJ n. 01/2014.”

 

Assim, não há nenhum direito líquido e certo do Impetrante sendo ameaçado, uma vez que, na forma dos artigos 128[2], 293[3] e 460[4] do CPC, o CNJ está adstrito ao pedido formulado no Pedido de Providências que, por sua vez, restringe-se a pleitear providências visando zelar e dar cumprimento à LOMAN.

 

Pelo exposto, estão de todo ausentes os requisitos autorizadores do deferimento da liminar pleiteada bem como da concessão da segurança.

 

VII – CONCLUSÃO

 

Diante do exposto, restou demonstrado que o Pedido de Providências n. 0006166-87.2014.2.00.0000 protocolado perante o CNJ tem por objeto questão de (i)legalidade de norma regimental, estando no âmbito da competência do CNJ estabelecida no artigo 103-B, § 4º e inciso I da Constituição Federal para fins de controle da atuação administrativa dos Tribunais e cumprimento do Estatuto da Magistratura.  Não houve naquele procedimento, conforme demonstrado, invocação de controle de constitucionalidade, mas sim de “flagrante violação ao art. 102 da LOMAN”. Ademais, inocorre qualquer tentativa de violação à autonomia do Poder Judiciário.

 

 

Isto posto, requerem os ora Impetrados impugnantes:

 

a)     seja rechaçada a conexão suscitada pelo Impetrante entre o presente Mandado de Segurança e a Reclamação nº 13.115;

 

b)     seja reconhecida a conexão do presente Mandado de Segurança com o Mandado de Segurança nº 32.451, da relatoria do Ministro Ricardo Lewandowski;

 

c)     seja admitido o seu ingresso nos autos na qualidade de litisconsortes passivos necessários, bem como seja assinado prazo para que o Impetrante requeira e promova a citação dos demais litisconsortes passivos necessários (Sindicato dos Titulares de Serventias, Ofícios de Justiça e Similares do Estado do Rio de Janeiro – SINTERJ e Desembargador aposentado Thiago Ribas Filho), sob pena de declarar extinto o processo;

d)     diante do desatendimento aos requisitos da Lei 12.016/2009, não tendo restado demonstrado pelo Impetrante direito líquido e certo idôneo a merecer a proteção mandamental, muito menos qualquer ato ilegal ou de abuso de poder, seja indeferida a liminar pleiteada;

e)     e, por fim, seja denegada a segurança pleiteada, reconhecendo-se que a atuação do CNJ no exame da (i)legalidade de normas regimentais acomoda-se perfeitamente no âmbito de sua competência estabelecida pela Constituição Federal.

Termos em que,                                                          …………………………………….pedem deferimento.

Brasilia, 10 de novembro de 2014

   CARLOS ROBERTO SIQUEIRA CASTRO                           OAB/RJ nº 20.283

 

 

 

 

 

 

 

 

[1] CELSO AGRÍCOLA BARBI,”Do Mandado de Segurança”, Forense, RJ, 9ª ed., 2000, p. 131

[2] Art. 128. O juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte.

[3] Art. 293. Os pedidos são interpretados restritivamente, compreendendo-se, entretanto, no principal os juros legais.

[4] Art. 460. É defeso ao juiz proferir sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que Ihe foi demandado.